Novo concerto combina os repertórios de Valencianas I e II, que emprestam roupagem erudita às músicas do pernambucano

O músico Alceu Valença e o maestro Rodrigo Toffolo, diretor da Orquestra Ouro Preto, durante apresentação do projeto Valencianas | Foto: Rafael Garcia/Divulgação

Faz dez anos que Alceu Valença e a Orquestra Ouro Preto subiram ao imponente palco do Grande Teatro do Palácio das Artes para, emoldurados por seus amplos painéis de cobre e diante de uma plateia lotada, gravarem pela primeira vez, em CD e DVD, o concerto Valencianas, que, idealizado por Paulo Roberto Lage, empresta uma roupagem mais erudita ao cancioneiro popular do pernambucano. A mistura deu tão certo que, logo, o projeto venceria a categoria de maior prestígio do Prêmio da Música Brasileira, sendo eleito o melhor disco de MPB daquele ano. E o formato, claro, além de conquistar a crítica, seduziu o público. Tanto que, no rastro de tanto sucesso, o segundo volume do álbum chegou cinco anos depois, sendo gravado, desta vez, em Porto, no litoral lusitano.

Agora, nesta sexta-feira (26) e sábado (27), Alceu Valença e Orquestra Ouro Preto voltam ao mesmo lugar onde toda essa história começou para a apresentação de dois concertos, que combinam os repertórios de Valencianas I e II. Um retorno, vale dizer, que mexe com as emoções do compositor de sucessos como “Tropicana”, “Anunciação” e “La Belle de Jour”, que recorre à letra de uma música sua para descrever o significado que atribui às novas apresentações: “A gente/ Segue o tempo e ninguém nota/ Seus caminhos, suas rotas/ Por onde o tempo seguiu”, começando, tomando fôlego para concluir: “Depois/ Quer viver tudo que viu/ Vai bater na mesma porta/ De onde um dia saiu”.

“Essa canção me faz lembrar aquele primeiro concerto que fizemos, em 2014, que foi tão bom que me faz voltar à mesma casa, bater à mesma porta, de onde saímos com essa parceria tão bonita, onde fomos recebidos por uma plateia tão vibrante”, reflete, após recitar trechos de “Samba do Tempo”, gravada originalmente no álbum Na Embolada do Tempo, de 2005, e que também ganhou versão orquestral em Valencianas II.

E a passagem por BH ganha uma aura ainda mais especial por ser a última parada do grupo em solo mineiro antes de os artistas saírem em turnê pela Europa, passando por seis países, entre capitais e outros destinos, nos meses de janeiro e fevereiro de 2025. No período, o concerto encontrará abrigo em Londres, na Inglaterra, em Amsterdã, na Holanda, em Berlim, na Alemanha, em Paris, na França, em Barcelona e Madri, na Espanha, e em Porto, em Portugal.

“Tenho certeza que vai ser sensacional! Vai ser no inverno europeu, e nós vamos esquentar um pouco as almas, corpos e mentes das pessoas de lá”, garante o músico, que está vindo de outra tour no Velho Mundo, onde se apresentou, no ano passado, com o show “Alceu Dispor”.

O universo de Valencianas em expansão

Igualmente animado, Rodrigo Toffolo, diretor artístico e maestro da Orquestra Ouro Preto, comenta que a ideia de levar Valencianas para outros lugares na Europa vinha sendo discutido desde o início deste ano. “Depois de gravar o DVD do segundo volume em Porto, nossa intenção era expandir esse projeto para outros horizontes. Quando surgiu a oportunidade, abraçamos!”, descreve, classificando a turnê como a coroação de um bem-sucedido ciclo que, no fundo, trata de uma coisa muito importante para todos os envolvidos: a música brasileira – “essa paixão, que merece todo cuidado, é o que nos motiva”, garante.

E se, para Toffolo, a música brasileira se impõe como um norte e uma missão, nada mais oportuno que ter ao seu lado alguém que considera, mais que uma referência, um mestre. “Eu digo e repito que o Alceu Valença é uma figura muito, muito especial. Ele é um profundo conhecedor do povo brasileiro, do Brasil de verdade. E a maneira como a carreira dele se consolidou reforça e comprova a importância de sua música”, elogia, assinalando que se reflete em constante aprendizado a convivência com o artista – um sujeito inquieto e inventivo, que ousa fugir das conveniências e declamar versos mesmo em uma protocolar entrevista, como fez, duas vezes, na conversa por telefone com O TEMPO

“Quando vou re-estudar Valencianas para novos concertos, sempre esbarro em anotações que faço nas partituras, que são fruto de conversas com ele, de correções que ele próprio faz. Com o tempo, sinto que tenho o privilégio de entender, na prática, o tipo de visão de música que ele tem”, aponta o maestro. “É um mestre consumado da música brasileira, que merece muito ser reverenciado”, reforça, constatando que, felizmente, é o que vem acontecendo a cada nova apresentação – que, via de regra, é recebida com entusiasmo por plateias muito diversas.

“Acontece que ele conseguiu algo muito raro, que é rejuvenescer o seu público. Ele toca para pessoas de todas as idades, incluindo crianças. Um público que, agora, com os concertos, tem a oportunidade de vê-lo em um lugar diferente, ao lado de uma orquestra”, menciona.

Mistérios gloriosos

Ao falar sobre essa capacidade de diálogo com uma plateia tão variada e o recente destaque que a presença de crianças passou a ter nos seus shows, Alceu Valença reage com um misto de franqueza e modéstia. Em parte, ele sustenta que a internet contribuiu para o fenômeno à medida que possibilitou a democratização da arte. “Antigamente, você chegava aqui no Brasil e só ouvia música americana – e tem boas músicas americanas, não é este o ponto. A questão é que tudo era cantado em inglês. Com a internet, a coisa mudou muito e, agora, você escuta música brasileira inclusive fora do Brasil. Isso foi muito bom para mim”, aponta. 

Mas o artista também admite não entender muito como algumas canções simplesmente viralizam. “Isso eu nem me arrisco a tentar explicar”, diz, entre risadas, ponderando, ainda, que tanto sucesso parecia distante para ele há alguns anos. “Olha, demorou muito para que eu chegasse até aqui. Teve um determinado momento que as gravadoras me tiraram das rádios. Não tocava nada. ‘Belle de Jour’, por exemplo, não tocou quase nada e, hoje, é esse sucesso”, reflete o músico, que, inspirado pelo nome deste veículo de imprensa e pelos rumos da conversa, mergulhada nos mistérios por trás do encantamento infantil que sua música desperta, encerrou a entrevista com versos de “Embolada do Tempo”: “O tempo em si/ Não tem fim/ Não tem começo/ Mesmo pensado ao avesso/ Não se pode mensurar”.

SERVIÇO:
O quê. Concerto “Valencianas: Alceu Valença e Orquestra Ouro Preto”
Quando. Nesta sexta-feira (26) e sábado (27), às 20h30
Onde. Grande Teatro do Palácio das Artes (avenida Afonso Pena, 1.537, centro)
Quanto. A partir de R$ 110 (meia entrada, Plateia Superior). Ingressos no site Eventim ou na bilheteria do teatro

Fonte: O Tempo

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