Compartilhamento de conteúdos gravados e o armazenamento de informações pessoais têm levado recrutadores e headhunters a buscar formação e treinamento em tecnologia e ética
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No mundo corporativo, os terríveis anos da pandemia de Covid-19, entre 2020 e 2022, aceleraram, de maneira ainda não vista, a transformação digital das empresas e das relações de trabalho. Se, de um lado, os modelos remotos se tornaram a solução para uma parte significativa das empresas não parar diante da necessidade do afastamento social para controlar a disseminação do vírus, de outro, era preciso alterar também a forma de atrair e fazer a seleção de talentos.
O que parecia uma solução emergencial – a seleção remota -, se arrastou por dois anos e se mostrou eficiente e bem mais barata que os métodos tradicionais. Quatro anos depois, o formato segue bastante utilizado, mas anda sendo questionado. A dificuldade de fazer análises subjetivas, como da linguagem corporal através da tela, e questões como o compartilhamento de conteúdos gravados e a guarda de dados pessoais, levam recrutadores e headhunters a buscar formação e treinamento em tecnologia e ética.
De acordo com a gerente de Atração e Seleção do Grupo Selpe, Jacqueline Parreiras, a seleção remota serve para qualquer tipo de empresa, desde que a cultura organizacional já esteja aberta ao uso da tecnologia para seleção de talentos.
“A seleção remota é um modelo que se popularizou com a pandemia e veio para ficar. A tecnologia permitiu a flexibilidade na agenda, liberdade geográfica, menor custo, possibilidade de agregar outras etapas, por exemplo. Algumas empresas, porém, sentem uma insegurança e aí indicamos fazer só a última etapa seja presencial. A técnica e o tipo de entrevista não mudam, são apenas adaptadas para o on-line. O recrutador vai conseguir observar se o candidato é aderente à empresa ou não. O que muda é a preparação. Tem que ter um cuidado com o espaço, fazer com que seja acolhedor, observar as questões técnicas, como a conexão, por exemplo, para não deixar o candidato mais nervoso”, aponta Jacqueline Parreiras.
Outro detalhe importante tem a ver com privacidade e proteção de dados. Toda gravação e compartilhamento de entrevistas e outras interações on-line devem ser expressamente consentidas.
Para o fundador e sócio da Tailor – consultoria de executive search -, Bruno da Matta Machado, na seleção de executivos é recomendável que a última etapa seja feita presencialmente, com a participação dos donos ou do CEO da empresa.
“No nosso nível de atuação, não recomendamos a condução 100% remota. São posições com nível de estratégia e de senioridade muito grandes. O presencial é muito importante. Essa confiança e afinidade fazem toda a diferença no aperto de mão. O remoto é para otimizar o tempo nas etapas de identificação e triagem. Há todo um preparo para conduzir as entrevistas on-line porque as subjetividades são mais difíceis de serem captadas. O gelo é quebrado mais fácil no presencial e assim identificarmos padrões comportamentais. No virtual a pessoa olha menos para os olhos do interlocutor. Para ultrapassar essa dificuldade inicial, faço conversas mais informais e longas, identificando gostos e experiências que estão no currículo. São necessárias pelo menos duas etapas por vídeo para refinar o olhar e fazer investigações ligadas à cultura da empresa. Na última etapa levamos o candidato para conhecer a estrutura da empresa e as pessoas que trabalham lá”, afirma Machado.
Tendências como a demissão silenciosa podem ter origem ainda no processo de seleção. Para evitar uma contratação desastrada, a empresa precisa se esforçar para ser uma “marca empregadora” desde a seleção.
O e-book “Por que bons funcionários pedem demissão”, publicado pela VR Benefícios no início de 2023, lista as tendências para os próximos anos e destaca a transparência na relação entre empresa e empregados como algo fundamental. Do recrutamento, com informações sobre o salário logo na divulgação das vagas de trabalho, até o modelo de negócios com mais flexibilidade, análise de dados e liberdade com responsabilidade, como aquele adotado por startups.
Também estão na lista:
- Valorização das soft skills, como criatividade, inteligência emocional, iniciativa e capacidade de se reinventar, em vez de valorizar unicamente o currículo acadêmico e as experiências profissionais de cada candidato.
- Organizações menos hierárquicas e lideranças mais estratégicas para alinhar os times.
- Trabalho híbrido ou remoto, em vez do modelo 100% presencial.
“As empresas precisam olhar para o departamento de gestão de pessoas como olham para o departamento comercial. Um é tão estratégico e fundamental para os resultados do negócio quanto o outro. As empresas ainda não valorizam os recrutadores internos ou externos na sua capacitação e qualificação para evitar prejuízos. O recrutador precisa ser treinado para ter uma visão consultiva e analítica de todo o processo”, pontua o fundador da Tailor.
LinkedIn é ferramenta eficiente para seleção remota
Dados publicados em 2022 revelam que 90% dos recrutadores usam regularmente o LinkedIn. Um estudo divulgado pela Statistic Brain mostrou que aproximadamente 22 milhões de pessoas conseguiram uma entrevista através do LinkedIn, sendo que 35,5 milhões foram contratadas através de contato realizado no site.
O estudo também revelou que os colaboradores contratados a partir do contato feito pelo LinkedIn têm, em média, 40% menos chances de deixar o emprego nos seis primeiros meses.
O princípio básico de uma marca empregadora é a comunicação transparente. Tudo começa pelo perfil institucional da empresa na rede. Ele precisa apresentar as principais informações de forma direta e leve, além de dar acesso a outros canais de comunicação, aos líderes e outros colaboradores.
“As redes sociais podem ter um papel relevante no processo de atração e seleção remota, mas precisam ser usadas com sabedoria. O LinkedIn é um ambiente 100% profissional, com ferramentas pagas que oferecem ótimos resultados. Por não ser uma rede genérica, ele tem menor alcance, porém é muito mais direcionada”, destaca a gerente de Atração e Seleção do Grupo Selpe. Essa reportagem faz parte da página temática “Pessoas”.
Fonte: Diário do Comércio